Carolina de Jesus é autora e protagonista da obra que conta a história da modernidade que não chegou nas periferias do Brasil nos anos 50.
Uma das obras mais emblemáticas da literatura brasileira do século passado completou 60 anos em 2020. Em mais de 18 cadernos encontrados em lixões, Maria Carolina de Jesus (1914 - 1977) escreveu um diário sobre sua realidade, como catadora de materiais recicláveis e moradora da favela do Canindé, Zona Norte de São Paulo.
Com apenas o segundo ano do fundamental concluído, Carolina de Jesus sempre gostou de literatura e “devorava” todos os livros que encontrava, boa parte deles no lixão. As anotações - que mais tarde vieram a se tornar um livro por intermédio do jornalista Audálio Dantas - contava a história de um Brasil miserável, oposto da apresentada pelo governo JK, que representava modernidade, tecnologia e qualidade de vida. Mas a publicação da obra só foi possível graças a casualidade do destino
Em busca de uma reportagem na favela do Canindé, o jornalista Audálio Dantas conheceu Carolina de Jesus, que contou sobre seu livro. De volta a redação, Dantas publicou uma matéria sobre a catadora de recicláveis e seus esforços para criar os três filhos enquanto escrevia um diário sobre a vida na favela. A Editora Francisco Alves se interessou em publicar as anotações.
Na primeira semana, “Quarto de Despejo” vendeu mais de 10 mil exemplares e foi traduzido para 14 idiomas e publicado em mais de 40 países. A editora pagou dois mil cruzeiros para Carolina de Jesus, que usou o dinheiro para comprar uma casa em Santana, bairro da Zona Norte da capital. Mais tarde, ela vendeu o imóvel e comprou um sítio, em Parelheiros.
Em o “Quarto de Despejo”, Carolina de Jesus já inicia a obra apresentando um novo conceito de escravidão vinculado a fome. Suas mais de 150 páginas mostram a pobreza em sua forma mais crua. Era o avanço da modernidade no país frente a exclusão das camadas mais pobres, contada por uma vítima do sistema. Apesar de Audálio fazer uma revisão no livro e corrigir acentuações, o jornalista manteve a gramática e a ortografia usada pela autora nos manuscritos.
A autora ainda lançou mais três livros: “Casa de Alvenaria” (1961), “Pedaços de Fome” (1963) e “Provérbios” (1963). Nenhum deles teve o mesmo sucesso do livro de estreia e Carolina de Jesus voltou a vender materiais recicláveis para sobreviver. Com bronquite asmática, a escritora morreu no anonimato e na pobreza, em 13 de fevereiro de 1977, aos 64 anos.
Imagem Destaque: Canal Ciências Criminais
Por Julia Bispo
Jornalista, possui experiência em produção de conteúdos voltado à comunicação social. Já atuou com assessoria de imprensa e comunicação interna, nas áreas de Saúde, Beleza, Bem-Estar, Varejo e Negócios.